Existe um paradoxo na medicina atual, que é o seguinte. Normalmente, quanto mais tratamento disponíveis existem para qualquer condição, a gente tende a ver uma menor incidência e prevalência e uma menor gravidade — uma menor manifestação dessas doenças. É algo lógico de se pensar.
Mas o que a gente está vendo com obesidade, diabetes, depressão e ansiedade é o contrário: a gente tem cada vez mais tratamentos disponíveis, cada vez mais remédios para obesidade, remédios para diabetes, remédios para depressão e ansiedade.
Mas, ao invés de diminuir a incidência e diminuir a manifestação dessas doenças, elas estão cada vez mais aumentando.”
O Dr. Régis Chachamovich é um profissional diferenciado.
Isso porque é uma das poucas pessoas — no Brasil e no mundo — com uma experiência clínica significativa de usar a alimentação para tratar questões psiquiátricas e mentais.
Nesta entrevista, você vai aprender a fascinante relação entre alimentação e saúde mental.
Incluindo condições que possivelmente você nem imaginaria que são tão influenciadas pela dieta.
Condições diversas como depressão, ansiedade, autismo, mal de Alzheimer, transtorno bipolar, e muitas outras.
Sendo assim, escute este podcast com atenção para saber tudo sobre:
- como o Régis descobriu a dieta low-carb e cetogênica graças a sua esposa — e como sua carreira mudou completamente depois de conhecer essas estratégias,
- o panorama histórico de como as dietas low-carb e cetogênica vêm sendo usadas há décadas para tratar questões mentais,
- quais condições neurológicas podem se beneficiar da dieta low-carb e da dieta cetogênica,
- depressão, ansiedade, autismo, mal de Alzheimer, transtorno bipolar: como a alimentação pode ajudar a tratar cada uma dessas condições,
- por qual motivo a dieta cetogênica ajuda em todas essas condições,
- a ligação entre jejum intermitente e saúde mental,
- “dietas restritivas” (como low-carb e cetogênica) podem levar à compulsão alimentar? E o jejum?
- se eu sou saudável, a low-carb / cetogênica podem prevenir problemas mentais no futuro?
- a verdade sobre alimentação e mal de Alzheimer — e por que a dieta cetogênica pode ajudar nesses casos,
- a intervenção alimentar que ajuda a tratar muitos casos de autismo: duas proteínas que se deve evitar a todo custo,
- hábitos importantes para manter a boa saúde mental,
- a mensagem final do Dr. Régis para você,
e muito, muito mais.
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Abaixo você encontra nosso agradecimento aos apoiadores que possibilitam este projeto ser um sucesso.
E também a transcrição completa do episódio.
Para ser avisado de novos episódios, lembre-se de nos seguir no email e no canal do Telegram.
Tem episódios novos todas às segundas e sextas-feiras.
Conteúdo do post:
Obrigado Aos Apoiadores Do Podcast
Bem-vindo a mais um podcast do Senhor Tanquinho.
Somos Guilherme e Roney, e aqui a nossa missão é deixar você no controle do seu corpo.
Antes de irmos ao episódio em si, queremos agradecer aos apoiadores que tornam este projeto possível.
Apoiador #1 — Loja Online Tudo Low-Carb
Este podcast é um oferecimento da loja online Tudo Low-Carb.
A Tudo Low-Carb é uma loja que vende somente produtos que se encaixam numa dieta low-carb e cetogênica.
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Além de temperos e produtos naturais, feitos com comida de verdade.
Nós conhecemos pessoalmente Eliana, fundadora da loja.
E ela nos garantiu que monitora constantemente os valores para que a Tudo Low-Carb tenha os melhores preços dos adoçantes xilitol, eritritol e da farinha de amêndoas.
Então, se esse é o seu caso, se você quer comprar ingredientes para receitas low-carb, recomendamos acessar a Tudo Low-Carb — porque lá é garantido que você vai encontrar.
Apoiador #2 — Medidor de cetonas Uaiketo
Esse podcast também é um oferecimento do Uaiketo — e o que é o Uaiketo?
O Uaiketo é um aparelhinho que serve para medir o seu nível de cetose através do hálito.
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Este podcast só existe graças aos alunos do nosso programa VIP Guia Dieta Cetogênica.
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Então, são centenas de receitas. Tem também o nosso livro de apoio, com 120 dúvidas sobre alimentação saudável respondidas, com prefácio do Dr. José Neto, um livro super elogiado por profissionais como o Dr. Rodrigo Bomeny, Danilo Balu e por vários e vários convidados que já passaram pelo nosso podcast.
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Então, convido você a conhecer o nosso programa Guia Dieta Cetogênica.
Transcrição Completa Do Podcast Com Dr. Régis Chachamovich
Guilherme – Olá, Tanquinho, olá Tanquinha sejam muito bem-vindos e muito bem-vindas a mais um episódio do nosso podcast. Hoje trazemos o médico psiquiatra o Dr Régis Chachamovich como o nosso convidado. Tudo bem, Régis? Como você está?
Régis – Tudo certo. Tudo bem com vocês? Obrigado pelo convite.
Roney – O prazer é nosso ter você com a gente hoje Régis. Vamos começar apresentando você para o pessoal que está nos ouvindo.
Conta sua história para gente. Como você começou a se interessar por medicina, por essa sua área de atuação. E, num segundo momento, até pelas estratégias baixas em carboidratos.
Régis – Então vamos lá. Minha formação é em medicina.
Eu fiz medicina com vontade de seguir a área de psiquiatria desde a época da faculdade. A minha primeira paixão era pela psicanálise. E isso é algo que continua. Eu fiz a formação em psicoterapia psicanalítica assim que eu saí da residência em psiquiatria. Continuo praticando e tenho o meu consultório de psicoterapia até hoje.
Ao mesmo tempo fui fazendo o que a gente chama de psiquiatria clínica.
Aquela psiquiatria de diagnóstico, tratamento mais objetivos, remédios — que é a basicamente a ferramenta que a gente aprende a usar na formação de psiquiatria.
Então essa foi a minha prática quando terminei a residência em 2006.
Até o ano de 2014 eu não sabia da existência de low-carb — o que a gente tem na faculdade de medicina sobre nutrição é muito pouco.
Na residência de psiquiatria é praticamente zero.
Não se estuda a influência da alimentação na saúde mental.
Como Régis Descobriu A Low-Carb Graças A Sua Esposa
A minha descoberta da low-carb foi por uma via pessoal e nada a ver pela prática profissional. Foi através da minha esposa que tinha e sempre teve diagnóstico de síndrome do ovário policístico (SOP).
Sempre ouviu, desde a adolescência e pré-adolescência, que iria ter muita dificuldade de engravidar quando quisesse.
Tomou anticoncepcional oral como forma de tratamento entre aspas das manifestações da SOP.
Quando a gente decidiu engravidar em 2014, ela consultou com endocrinologista, e ele fez a conduta padrão: prescreveu metformina medicação que se usa para o diabetes.
Ela tomou, mas não se adaptou bem, teve uma série de efeitos colaterais e parou de tomar. Aí começou a pesquisar. Ela é nutricionista de formação. Não trabalha como nutricionista.
Mas nessa época ela saia para trabalhar umas duas semanas por mês.
Nessas viagens, um dia conversando pelo telefone à noite ela disse “pesquisei aqui e vou começar uma dieta low-carb amanhã”.
Eu, na minha reação esperada, do meu conhecimento na época, disse “como assim dieta low-carb? Está maluca? Isso não vai funcionar e vai ser ruim para ti”.
Mas ela estava convicta, fez a pesquisa dela e estava convicta.
Então eu pensei “não me resta nada a não ser pesquisar também”.
Aí eu comecei a ir atrás.
A gente viu que tinha muita coisa publicada sobre dieta “low-carb” inclusive para infertilidade relacionada a ovários policísticos.
Nós dois então resolvemos começar a dieta e funcionou super bem: em menos de seis meses ela estava grávida, sem nenhuma manifestação clínica de ovários policísticos.
Nós dois perdemos peso, que era uma coisa que os dois tinham muita dificuldade de conseguir com as dietas tradicionais seguindo as orientações, sendo disciplinados e fazendo atividades físicas.
Então foi possível para nós dois perder peso.
A partir daí interessei por essa estratégia e comecei a estudar.
Mas foi muito de curioso, muito para a minha satisfação pessoal.
Eu comecei a adotar esse tipo de alimentação para mim, mas mantinha a minha vida profissional independente disso, não imaginava que pudesse entrar na minha prática.
Mas fui cada vez mais estudando, me interessando, ouvindo e vendo muitos podcasts, muitos podcasts daqui e muitos podcasts de fora.
Estudando artigos, e vendo muita coisa no Youtube, pesquisando vídeos e apresentações.
Até que eu comecei a me interessar muito pela área da medicina metabólica: medicina e obesidade especificamente.
Há dois ou três anos atrás eu resolvi que essa poderia ser uma área de atuação. Uma coisa meio incomum para o psiquiatra querer por essa linha.
Mas era uma coisa que era tão fascinante pra mim…
Comecei a fazer alguns cursos online, cursos de fora muito bons da “Nutrition Network” que é uma organização grande e com muitos grandes nomes na área.
Eu fiz alguns cursos de regressão de diabetes, obesidade e low-carb na parte clínica. Depois eu fiz curso aqui do Souto e do Bomeny, que é um curso excelente, é uma referência para nós.
Então a partir daí eu comecei a implementar na minha prática, adotar isso para tratamento a disfunções metabólicas, obesidade e diabetes principalmente.
Mas eu nunca imaginei que isso pudesse ter alguma aplicação para saúde mental.
Até a nossa época — dois anos atrás, mais ou menos — eu achava que diabetes, obesidade, ovários policísticos se beneficiam, mas só.
Até que nas minhas pesquisas eu encontrei dois psiquiatras americanos: a Georgia Ede e o Chris Palmer, que trabalhavam com essa abordagem cetogênica e low-carb em psiquiatria. Então minha cabeça abriu, foi um mundo novo que jamais imaginava.
Então entrei de cabeça nisso e comecei a pesquisar.
Entrei em contato com eles por e-mail — e eles, para minha surpresa, responderam os meus e-mails e trocamos informações.
Conversei com ela (Georgia Ede), que se interessou em conversar comigo, disse que queria saber quem eu era, um psiquiatra do sul do Brasil que está interessado em adotar isso.
Então a gente conversou durante quase duas horas, informalmente, para trocar experiência e para ela me passar a experiência dela, para eu contar a minha história para ela, porque ela queria saber.
Então comecei a pesquisar mais isso.
E passei a entender que isso tem um papel muito grande na psiquiatria, um potencial enorme.
Aí fui fazer cursos na área, fiz um treinamento recente com a Georgia Ede que é espetacular.
Assisti a muitas palestras, estudei artigos e comecei a implementar isso.
É onde eu me encontro hoje: com a minha prática de psicanálise mantida, que é uma coisa que eu gosto muito de fazer.
Com a minha prática de low-carb e cetogênica para disfunções metabólicas… e agora também para doenças psiquiátricas.
A Verdadeira História Da Dieta Cetogênica E Questões Mentais
Guilherme – Legal, Régis. Então você foi descobrindo ao longo do processo várias das aplicações de dietas em carboidratos. Desde os ovários policísticos até a perda de peso, que foi um “efeito colateral” benéfico — no seu caso, e no da sua esposa — e chegou na questão da psiquiatria.
Mas não necessariamente usar uma dieta, por exemplo, cetogênica para tratar questões psiquiátricas ou mentais é uma coisa necessariamente nova.
Você pode contar um pouquinho da história da dieta cetogênica e questões mentais?
Régis – Não é nada novo. Apesar do que a gente ouve muitas vezes que seriam “dietas da moda”, a gente sabe que não é assim.
A dieta cetogênica tem 100 anos de aplicação para epilepsia.”
No começo tinha epilepsia em crianças. Então era uma abordagem comum, especialmente antes do surgimento das medicações, dos anticonvulsivos.
No começo da década de 20, de 1920. O que se sabia na época era que essas crianças tinham epilepsia, mesmo as crianças com epilepsia de difícil controle, elas quando ficavam de jejum, a tendência era que as convulsões parassem e diminuíssem muito ou até parassem.
Isso era uma coisa que se sabia nessa época.
Então o uso terapêutico da dieta cetogênica começou nessa época há 100 anos atrás, é bem antigo.
E foi justamente uma maneira de imitar os efeitos metabólicos que o estado de jejum provocavam: efeitos saudáveis, efeitos benéficos.
Bom a gente sabe que a psiquiatria e neurologia têm uma interface real.
A divisão entre a psiquiatria e a neurologia é muito mais didática do que prática.
Várias das doenças neurológicas têm características fisiopatológicas parecidas ou bastante parecidas com doenças psiquiátricas.
Então o uso das abordagens cetogênicas ou restrição de carboidratos para neuropsiquiatria é uma coisa antiga — bastante antiga.
Quais Condições Neurológicas Podem Se Beneficiar Da Dieta Low-Carb E Da Dieta Cetogênica
Roney – Certo, Régis. Nesse âmbito, quais seriam algumas condições neurológicas que podem ser tratadas ou no mínimo melhoradas com uma alimentação baixa em carboidratos?
Régis – Essa é uma pergunta muito interessante, porque é uma pergunta cuja resposta está sendo construída com o tempo.
E a resposta está cada vez mais ampliada: a gente vai descobrindo novas aplicações para abordagem low-carb e cetogênica.
Então a epilepsia, como a gente estava comentando antes, é uma que já se sabe há muito tempo.
A doença de Alzheimer, por exemplo, é um campo muito promissor para aplicação da dieta cetogênica.
Primeiro porque a gente sabe que a fisiopatologia do Alzheimer tem características para quais a dieta cetogênica é muito eficiente.
Segundo porque os tratamentos medicamentosos disponíveis têm um efeito muito pequeno, muito pobre.
Você consegue pouco com os remédios disponíveis para o tratamento de Alzheimer.
E terceiro porque as pesquisas que já existem estão apontando para uma mesma direção.
Que é a direção do benefício e potencial da dieta cetogênica para o Alzheimer.
Então recentemente saiu um ensaio clínico randomizado, cruzado, em que o mesmo grupo que faz as duas abordagens.
Primeiro uma dieta cetogênica, e depois uma dieta padrão. E o estudo mostrou benefícios significativos, estatisticamente significativos para diversos sintomas do Alzheimer.
A gente sabe que enxaqueca é uma condição muito frequente com boa resposta a dieta cetogênica.
E, puxando mais para parte da psiquiatria, aí o mundo se abre.
Depressão e ansiedade, que é o grosso do que se vê na psiquiatria hoje em dia, são condições que cada vez mais a gente vê que melhoram ou costumam melhorar muito com a dieta cetogênica.
Além de doenças menos frequentes, mas muito graves — como esquizofrenia, por exemplo.
Existem relatos de casos, séries de casos, e pequenos estudos pilotos de melhoras às vezes impressionantes de esquizofrenia.
Transtorno bipolar é outra condição que também tem muito potencial de melhora. Então isso está aumentando — essa lista vai aumentando.
Com os próximos anos provavelmente vamos descobrir condições neuropsiquiátricas que podem se beneficiar bastante da cetogênica e low-carb.
Roney – Perfeito, Régis. Dentre essas condições que estão sendo estudadas e podem ser melhoradas com alimentação low-carb e cetogênica será que poderia incluir aí também depressão ou mesmo autismo?
Régis – Ótimo. O autismo até esqueci de falar na tua última pergunta.
Mas certamente: o autismo tem trabalhos mostrando e experiência de profissionais que trabalham cetogênica e autismo, tem relatos abundantes.
É uma condição que é parecida com o que eu estava dizendo para o Alzheimer, o potencial é especialmente grande porque as intervenções que existem disponíveis têm um efeito muito pequeno.
Não existem remédios específicos para autismo: o que se faz, pelo ao menos na parte médica, é tratar o que seria as manifestações comportamentais do autismo.
Então, sintomas de agitação e agressividade se tenta tratar com remédio.
Mas não existe um tratamento específico para isso.
A dieta cetogênica tem potencial grande, tem trabalhos que mostram, trabalhos de experimento controlados que mostram potenciais benefícios em algumas (não todas) das várias características sintomáticas do autismo.
Já a depressão é um mundo a parte, por vários fatores.
E existe aumento da incidência de depressão e ansiedade enorme nas últimas décadas.
Acompanhando a incidência enorme de outras doenças metabólicas que a gente estava falando antes: diabete e obesidade principalmente.
Existe um aumento muito grande, nas últimas quatro, cinco décadas.
A gente vê depressão e ansiedade na mesma tendência: cada vez aumentando mais.
Tem uma coisa que eu costumo comentar que é um paradoxo na medicina que a gente está observando em todas essas doenças.
Quando a gente observa isso, nos faz ligar uma luz amarela e pensar um pouco mais.
É o seguinte: normalmente, quanto mais tratamento disponíveis existem para qualquer condição, a gente tende a ver uma menor incidência e prevalência e uma menor gravidade, uma menor manifestação dessas doenças. É algo lógico de se pensar.
O que a gente está vendo com obesidade, diabetes, depressão e ansiedade é o contrário.
A gente tem cada vez mais tratamentos disponíveis, cada vez mais remédios para obesidade, remédios para diabetes, remédios para depressão e ansiedade.
Mas, ao invés de diminuir a incidência e diminuir a manifestação dessas doenças, elas estão cada vez mais aumentando.
A gente precisa primeiro pensar: será que a gente está olhando para o lugar certo?
Será que a gente está tentando ir realmente onde as causas dessas condições estão? A resposta é: provavelmente não.
Então a depressão está nesta lista, e também a ansiedade.
O que a gente tem visto é uma correlação muito grande entre as doenças metabólicas, notadamente obesidade e diabetes, com doenças psiquiátricas: transtorno bipolar, ansiedade e depressão principalmente.
O que se vê na prática é o potencial do benefício da low-carb/cetogênica para depressão e ansiedade principalmente.”
Aí a gente tem algo muito interessante de observar, que é o relato dos profissionais de saúde que trabalham com essa abordagem, mas não são psiquiatras.
Como na psiquiatria isso é algo inicial. existem poucos psiquiatras no mundo trabalhando com isso.
E, no Brasil, eu tenho pesquisado para ver se encontro algum psiquiatra que tenha essa aplicação na sua prática, mas ainda não encontrei.
Mas os relatos de endocrinologistas, médicos de família (daqui e de fora) que trabalham com low-carb/cetogênica é impressionante, é empolgante.
É muito comum a gente ver entrevistas de médicos clínicos que dizem algo como o seguinte.
Atendi um paciente com um quadro de diabetes, prescrevi uma dieta cetogênica para ele pensando nisso. Não se comentou em depressão e nem ansiedade na primeira avaliação.
Quando a pessoa volta dois, três meses depois ela perdeu peso, o diabete está bem controlado e a pessoa fala ‘aquela depressão que eu tinha melhorou, aquela ansiedade que eu tinha melhorou, aquela irritabilidade que eu tinha e as alterações de humor que eu tinha melhoraram bastante’.
Então, o que a prática está mostrando é que existe um benefício enorme e um potencial muito grande.
Eu brinco que a ciência está correndo atrás da prática nesse sentido.
Os trabalhos estão surgindo, mas ainda são poucos os trabalhos em psiquiatria especificamente. Na neurologia existem vários.
A gente tem muitos estudos que são de intervenção, que não são experimentos, aí sim mostrando o potencial benefício da cetogênica.
Os estudos de intervenção ainda são pequenos, mas eles vão surgindo.
Existe um interesse grande da comunidade acadêmica por isso. Mas o que a prática mostra é que a cetogênica é uma ferramenta muito valiosa.
Por Que A Dieta Cetogênica É Tão Poderosa
Guilherme – Perfeito, Régis. Mas a gente tem alguma especulação de como funciona, por que uma cetogênica pode ser poderosa para certas coisas como a depressão?
Régis – Interessante, porque a gente tem muita informação sobre isso.
Dos mecanismos, por exemplo, a gente tem muita literatura, muitos trabalhos mostrando isso.
A gente tem os mecanismos e alterações do metabolismo que estão na base das doenças neuropsiquiátricas ou de grande parte delas. Aí tem vários.
Mas a gente tem uma lista dos que são considerados os principais, o que a literatura e a ciência têm mostrado que são os principais.
E vale a pena citar pelo ao menos quatro deles, mas pelo ao menos de passagem — não quero ficar muito técnico —, mas quatro deles são muito comuns e cada vez mais se mostram que estão imbricados na neuropsiquiatras.
O primeiro é a diminuição do metabolismo cerebral da glicose.
Isso é algo que sabe muito bem para Alzheimer, a gente sabe que está implicado também na depressão, na ansiedade, no transtorno bipolar e nos quadros de enxaqueca, para ficar em alguns.
Então a diminuição do metabolismo cerebral e glicose.
O segundo é o quadro de resistência à insulina, que está relacionado com isso, tem a ver com esse metabolismo da glicose que é o quadro de base para obesidade, diabetes, ovários policísticos, hipertensão, doença cardíaca, avc, derrame e várias outras, até alguns tipos de câncer.
E isso também se vê com muita frequência doenças psiquiátricas / neurológicas.
O terceiro é o desbalanço de neurotransmissores, especialmente de um sistema glutamato-GABA, são dois neurotransmissores que estão sempre em balanço um com outro.
O glutamato é o neurotransmissor excitatório do sistema nervoso e o GABA é o contrário, é o neurotransmissor inibitório.
A gente sempre fala de um balanço entre um e outro — e se predomina um ou se predomina o outro.
O que a gente vê nas doenças psiquiátricas é que predomina uma expressão do glutamato.
É como se o cérebro estivesse sempre sendo “atiçado” e cutucado, e sempre disparando.
Outro mecanismo importantíssimo é a inflamação crônica, subclínica, aquela inflamação que não é aguda e forte.
O estado inflamatório persistente e crônico… isso é algo bem conhecido.
E o que a literatura mostra sobre o que a dieta cetogênica faz para todos esses mecanismos?
A gente vê que a dieta cetogênica altera — para melhor — todos eles.
Ela diminuiu a inflamação.
Ela melhora o balanço glutamato-GABA (aumenta a expressão do GABA, diminuindo a do glutamato, isso “acalma” o cérebro).
Ela melhora a resistência à insulina.
Então com o tempo o cérebro vai conseguindo usar mais a glicose.
Porque a insulina é um hormônio importante para a utilização de glicose e produção de energia.
E ao mesmo tempo, e talvez algo único, é que ela provê para o cérebro e para o corpo todo e para o cérebro especificamente os corpos cetônicos.
E o que a gente sabe hoje em dia os corpos cetônicos são combustível para o cérebro.
O cérebro pode usar os corpos cetônicos como combustível para produzir energia — com vantagens em relação a glicose.
Ele é um combustível mais eficaz.
Quer dizer: o cérebro é capaz de produzir mais energia a partir dos corpos cetônicos comparados com a glicose.
E, ao mesmo tempo, falando do subproduto nesse ciclo de produção de energia… que são os radicais livres, ligados ao estresse oxidativo, que é também um mecanismo importante na fisiopatologia…
Quando o cérebro usa o corpo cetônico ele produz menos radicais livres.
Ele aumenta a expressão de antioxidantes.
Quer dizer: é um conjunto de mecanismos que a gente sabe que a literatura mostra que existe.
São altamente benéficos para saúde do corpo inteiro. Mas especificamente para saúde cerebral.
Jejum Intermitente E Saúde Mental
Roney – Que legal, Régis. Então a gente vê que realmente tomar um pouco de cuidado com alimentação e fazer uma alimentação baixa em carboidratos pode ajudar no cérebro de muitas e muitas maneiras.
O jejum intermitente, a prática do jejum, poderia ajudar também de alguma forma em algumas condições? Se sim, por quais mecanismos?
Régis – O jejum é sempre um capítulo à parte.
Se fala hoje em dia muito em jejum, é algo que está em voga. Eu gosto muito do jejum.
Primeiro que a literatura sobre o jejum é antiga, é vasta.
Então a gente sabe que, o jejum, do ponto de vista metabólico (não especificamente do cérebro, mas do corpo como um todo) tem inúmeros benefícios. A gente sabe.
A gente sabe que o jejum provoca no corpo alterações metabólicas muito bem-vindas — por exemplo, baixar os níveis de insulina, que é algo muito benéfico.
O jejum é uma ótima forma de estimular o corpo a produzir corpos cetônicos.
Então nesse sentido tem benefícios.
Em relação à psiquiatria, eu não conheço trabalhos específicos que relacionam jejum com benefícios para doenças psiquiátricas.
Agora, o fato de não existir trabalhos mostrando que algo acontece não significa que não aconteça.
Pode acontecer, apenas não tem trabalhos mostrando.
O que eu penso juntando literatura científica e prática clínica: eu acho que o jejum tem potencial muito grande como intervenção para saúde cerebral, mas especificamente para intervenção e tratamento para doenças psiquiátricas. E aí, depressão, ansiedade, transtorno bipolar e esquizofrenia — acho que todos podem se beneficiar.
Mas o único cuidado que eu tenho no jejum em pessoas que têm algum tipo de transtorno mental são alguns cuidados específicos que eu não teria em relação a outras condições como diabetes e obesidade.
Um deles é o déficit nutricional.
A pessoa quando faz muito jejum, ela pode ter um consumo proteico da média do dia baixo, e vale a mesma coisa para gordura.
A gordura e a saúde cerebral é todo um capítulo que é muito interessante ver, porque a gordura é um elemento importantíssimo para a saúde do cérebro.
Então consumir gordura de menos, e proteínas de menos, também é uma coisa que me preocuparia.
A outra coisa é não colocar o elemento de cara que pode ser um dificultador.
Então sugerir já de cara que um determinado paciente comece uma dieta cetogênica e jejum isso pode ser um dificultador para ele conseguir implementar isso.
Outra coisa que vale a pena também comentar é em relação a transtornos alimentares: acabei deixando de fora das minhas questões anteriores, mas é um campo muito interessante de aplicação da cetogênica.
Aí eu faço uma ressalva para a anorexia.
Os quadros de anorexia a gente tem o cuidado de recomendar low-carb / cetogênica, eu não costumo fazer isso. O jejum mais ainda.
Para esse tipo de paciente eu não costumo recomendar dietas cetogênicas / low-carb e muito menos jejum.
Agora para transtorno alimentar e bulimia certamente sim.
Mas essas pessoas em geral são pessoas com histórico de relação com a comida muito complicado, muito delicado.
Então eu também acho que implementar jejum de cara é algo que eu vejo com receio.
O que eu costumo fazer na minha prática é começar uma dieta cetogênica / low-carb.
E eu vejo que o jejum é quase uma consequência inevitável, mas ele vem naturalmente de a pessoa começa a fazer uma dieta cetogênica e ela vai se adaptando, vai se sentindo melhor.
Daqui dois, três meses, comecei acordar sem fome e não tomo mais café da manhã.
Daqui a pouco, um dia ou outro eu estava na correria no almoço mas eu não estava com fome e não almocei e fui comer alguma coisa assim às 3 da tarde.
Então o jejum vem naturalmente.
Nesse caso é a hora que eu começo a falar sobre jejum e talvez protocolos mais estruturados de jejum.
Guilherme – Faz total sentido mesmo. Mesmo para a mudança alimentar de quem busca emagrecer, a gente também costuma recomendar primeiro a mudança alimentar — e depois o jejum vindo de forma natural.
Porque para uma pessoa que tem uma dieta ocidental padrão e está obeso e acima do peso… muitas vezes, só “comer por menos horas, das mesmas porcarias” não vai trazer uma melhora significativa.
Régis – Perfeito e concordo.
O que acaba acontecendo mais hoje em dia é que muitas vezes as pessoas já vêm perguntando de cara sobre o jejum.
O que eu acho ótimo. Acho ótimo o jejum está “na moda”. Ele não é moda.
Os trabalhos de jejuns existem literalmente há mais de 50 anos.
Mas o fato das pessoas estarem conversando sobre jejum eu acho ótimo.
Então às vezes as pessoas já vêm perguntando.
Então, por exemplo, se uma pessoa que vai tratar um quadro de diabetes e seria uma condição de saúde mental, seria um transtorno psiquiátrico por exemplo… e ela já sabe sobre a dieta cetogênica e sobre jejum… se ela já chega motivada para implementar as duas coisas — eu não vejo problema.
Mas eu concordo contigo se a pessoa está na sua dieta ocidental padrão cheia de tranqueiras. Então primeiro vamos limpar a dieta e colocar uma dieta saudável. E o jejum pode vir no segundo momento.
Dietas Low-Carb / Cetogênicas Não São Muito
Restritivas? Não Podem Levar À Compulsão Alimentar?
Roney – Perfeito, Régis. Você comentou um pouco sobre o jejum e a cetogênica com relação a distúrbios alimentares.
Mas uma coisa que as pessoas, principalmente quem não conhece muito sobre o assunto alega que talvez fazer uma dieta como low-carb /cetogênica ou começar a fazer jejum poderia levar algum distúrbio alimentar, por exemplo, uma compulsão alimentar.
Você já viu isso acontecer? Porque é o que parece pelas suas respostas e na nossa prática também justamente é o contrário.
Régis – Eu acho uma excelente pergunta — porque isso é algo que a gente ouve com muita frequência realmente se praticar jejum ou mesmo uma dieta low-carb/cetogênica desencadearia quadros de compulsão.
Primeiro: não é o que eu vejo. Definitivamente nunca vi isso acontecer na minha prática.
Não vi relatos de colegas que trabalham com low-carb / cetogênica de ver isso acontecer.
Eu lembrei agora que eu estava esses dias revendo uma entrevista do Doutor Atkins, um precursor de dietas de baixo carboidratos do século passado.
Era uma entrevista do começo desse século, acho que 2002 / 2003, um talk show americano em que uma pessoa recebia ligações e respondia perguntas para pessoas que faziam telefonemas.
Uma pessoa perguntou isso para ele (e era uma pessoa dos Vigilantes do Peso, inclusive). E ela perguntava se essa alimentação que ele está propondo (e ele já falava de cetose, falava de tudo que a gente está falando) não seria perigosa e poderia desencadear compulsão.
A entrevista foi fantástica, e ele disse: é muito pouco provável que isso aconteça, porque eu já tratei (eu não me lembro quantos, mas algo em torno de) 15 mil pacientes e eu nunca vi isso acontecer.
Então se isso acontece deve ser algo extremamente raro.
Realmente não se vê isso acontecer. Pelo contrário: se vê isso melhorar.
Pelo contrário: num trabalho recente do ano passado, foram três casos relatados por uma equipe americana de tratamento com dieta cetogênica e jejum para transtorno de compulsão alimentar.
Com resultados espetaculares: os três pacientes que eles relatam passaram de ter dois, três episódios de compulsão por semana para zero.
No seguimento de até 17 / 18 meses no estudo.
Então eu diria assim: para dizer que isso acontece, teria que mostrar dados consistentes. Eu nunca vi isso. A prática não mostra que isso aconteça: nem a minha e nem de colegas que eu conheço que trabalham com essa abordagem.
O que eu acho que tem uma certa verdade nessa fala é uma aproximação seria o déficit educacional — isso sim a gente vê e sabe que pode desencadear episódios de compulsão.
Uma pessoa dieta ocidental padrão, como a gente estava conversando antes, que é uma dieta muito pobre do ponto de vista nutricional: biscoito, bolacha, arroz, pão, macarrão — do ponto de vista nutricional, macro e micronutrientes, essa é uma dieta muito pobre.
Se a pessoa fizer jejum, acredito que ela vai ficar ainda mais desnutrida nesse sentido.
Acredito que vai desencadear (ou pode desencadear) episódios de compulsão.
Agora uma pessoa com uma dieta low-carb/cetogênica bem formulada, suficiente nos seus macro e micronutrientes — se essa pessoa fizer jejum e mantiver uma dieta assim eu não vejo isso desencadear compulsão, não vejo relatos.
Então realmente não vejo que isso pode acontecer.
Guilherme – Faz total sentido Régis. É interessante, como você mesmo aludiu agora, a gente focar numa dieta bem formulada.
Porque com certeza uma dieta que tem um monte de óleo de soja, maltodextrina, e shake de proteína pode até ser cetogênica pela proporção dos macronutrientes (carboidratos, proteínas, gorduras).
Mas certamente não vai ser tão nutritiva quanto uma dieta bem pensada e baseada em comida de verdade.
Régis – Perfeito. Tem um nutricionista e treinador que eu gosto muito, e que vocês conhecem, que é o Danilo Balu.
Ele tem uma “crítica que é assim — e ele é adepto das dietas redução de carboidratos. Mas ele comenta sempre, e eu concordo, que o nome low-carb tem um único problema.
Que é não falar nada a respeito da qualidade dos alimentos.
Porque a low-carb é restrição de carboidratos.
E como tu disse: dá para fazer low-carb com óleo de soja, dá para fazer tranquilamente, mas isso está longe de ser saudável.
Esse é sempre um asterisco que a gente bota low-carb / cetogênica bem formulada. Aí sim, aí é só benefícios.
Se Eu Sou Saudável, A Low-Carb / Cetogênica Podem Prevenir Problemas Mentais No Futuro?
Guilherme – Eu acredito que uma dúvida que algumas pessoas estão nos ouvindo agora podem ter é o seguinte: a gente falou um pouquinho das estratégias de baixo carboidratos — low-carb / cetogênica — para tratar condições neurológicas e psiquiátricas mentais.
Mas e se eu sou uma pessoa saudável que não tenho nenhum diagnóstico disso — eu posso esperar algum tipo de melhoria ou prevenção de alguma coisa no futuro para fazer essa abordagem?
Régis – Sem dúvida nenhuma.
As dietas de baixo carboidratos — low-carb / cetogênica — são muito úteis.
Quando a gente fala de aplicação para tratamento de distúrbios psiquiátricos, essa é uma das aplicações dessa dieta.
Eu diria que todas as condições que tem na sua base quadros de resistência à insulina e síndrome metabólica podem muito provavelmente ser prevenidas (ou a sua chance ser muito diminuída) ao se adotar uma alimentação com restrição de carboidratos.”
Então, por exemplo, isso é uma coisa que eu faço na minha prática com certa frequência, porque são condições muito frequentes.
Se eu atendo hoje em dia uma pessoa, vamos supor, uma pessoa que tem 43 anos e não tem nenhum distúrbio psiquiátrico, ela tem um leve sobrepeso, mas ela não é diabética, nem tem pré-diabetes, ela está basicamente saudável.
Talvez uma alteração ou outra: aumento de triglicérides, um HDL pouco baixo vamos dizer assim.
Eu costumo solicitar dosagem de insulina (eu acho que infelizmente não é adotado pela grande maioria dos médicos, mas deveria ser).
Mas ela tem um leve aumento dos níveis de insulina.
Mas ela me conta que tem uma história familiar extensa: que a mãe é diabética, tem a pressão alta, a avó tem Alzheimer, na família do pai tem muitos quadros de câncer, por exemplo.
Essa pessoa naturalmente está preocupada de que ela tem isso na família, que ela tem uma genética que predispõe para isso.
Não tenho dúvidas que essa pessoa pode se beneficiar com estilo de alimentação de baixo carboidratos. Isso é um exemplo.
Esse é um dos benefícios que a pessoa pode ter.
Além disso, uma pessoa que não tem nenhuma doença diagnosticada, mas quer ter um pouco mais de capacidade de se concentrar, um pouco mais de clareza para raciocinar ou que sente muito sono ao longo do dia.
Aquele sono grande depois do almoço ou que acorda com um certo cansaço com muita frequência, tem dores de cabeça com frequência, mesmo que não seja enxaqueca por exemplo.
Essa pessoa, se fizer uma alimentação low-carb, tem grandes chances de ter melhoria em várias ou todas essas sensações.
Além do que a gente sabe que os riscos são baixíssimos, são muito poucas situações que as pessoas não devem fazer uma dieta low-carb / cetogênica.
A gente fala brincando que, quando a gente adota essas estratégias ao invés de remédios, a gente troca efeitos colaterais para efeitos benéficos.
Então certamente tem muitas aplicações.
A Verdade Sobre Alimentação E Mal De Alzheimer
Roney – Com certeza, Régis. Ainda nessa questão da alimentação com a sua relação com o nosso cérebro e doenças relacionadas — o que a gente poderia falar a respeito do Alzheimer?
Régis – O Alzheimer é um capítulo interessantíssimo, a gente pode falar um monte de coisas. A gente poderia fazer um podcast inteiro só sobre Alzheimer.
O Alzheimer é uma condição cada vez mais prevalente: está aumentando a prevalência no mundo inteiro — e no Brasil também.
As estimativas da OMS são de que, nos próximos 30 anos, esse aumento deve se acelerar.
O Alzheimer é uma condição crônica que causa muito prejuízo e sofrimento para a pessoa que tem, mas, sobretudo, para as pessoas em torno dela, como cuidadores e familiares.
Uma situação que se torna dramática, arrastada.
Então a gente vê que são quadros muito complicados.
Há 100 anos, a gente tinha uma incidência muito baixa de Alzheimer — ela é uma “doença da modernidade”. Ela não é algo natural da nossa espécie.
A gente se acostumou, nas últimas gerações, a ouvir falar de Alzheimer. A gente se acostumou a pensar que é quase uma doença natural da senilidade, dos idosos, mas não é assim. Isso não é uma doença natural da nossa espécie.”
Esse é um aspecto.
Outro aspecto que eu estava comentando no início é que existe muita pesquisa, há muito tempo, para tentar desenvolver alguma droga, algum remédio eficaz para Alzheimer.
Para qualquer indústria farmacêutica que conseguir isso, vai ser uma mina de ouro.
Ainda assim, não teve nenhuma descoberta significativa, não tem nenhum remédio que tenha algum efeito minimamente satisfatório.
Não se consegue nem estagnar a progressão do Alzheimer com as medicações.
A gente pode no máximo desacelerar um pouco… mas não se tem benefícios significativos com nenhum tratamento disponível até agora, e não é por falta de investimento de pesquisa.
Então nada leva a crer que vai ter num futuro próximo um remédio promissor.
Por outro lado, já se sabe muita coisa em relação à fisiopatologia do Alzheimer. E muita coisa nova.
Quando eu fiz faculdade, por exemplo, no final da década de 90, a gente aprendia que o Alzheimer era uma doença na deposição de placas amiloides no cérebro.
Esse seria o problema do Alzheimer, esse sempre foi o padrão-ouro de diagnóstico: algo que só poderia ser feito por biópsia.
Então não se fazia em nenhuma pessoa viva.
O que se sabe nos últimos anos: é que uma característica fundamental do Alzheimer é a resistência à insulina em nível cerebral e a diminuição do metabolismo da glicose — coisas que falamos lá no início.
Sendo que existem exames que detectam como está o metabolismo da glicose no nível cerebral — a gente pode detectar alterações do metabolismo da glicose em pessoas até na sua quarta década, trinta e poucos anos ou quarenta anos.
As pessoas com Alzheimer têm uma diminuição acentuada no metabolismo da glicose.
Isso abre um mundo novo para intervenções.
Não é à toa que o Alzheimer é chamado de diabetes tipo 3: porque esse mecanismo de resistência à insulina é o mecanismo base do diabetes.”
(O diabetes tipo 2, que é o mais comum.)
Aí se abre um mundo inteiro de possibilidades de intervenção.
A principal delas é uma intervenção que drible esses mecanismos.
Uma intervenção que possa corrigir a diminuição de metabolismo de glicose e fazer com que o cérebro possa produzir energia suficiente.
Porque essa é a consequência de uma metabolização ruim da glicose: uma produção menor que deveria de energia.
Nenhum remédio é capaz de fazer isso. Mas a dieta cetogênica é capaz de fazer isso — e mais.
Ela melhora a resistência à insulina, ela provê para o cérebro os corpos cetônicos (que são realmente substâncias para o cérebro, são energia pura).
Aí a gente sabe, através de pesquisas, que mesmo num cérebro com Alzheimer a capacidade de usar os corpos cetônicos não está diminuída.
Então isso é fantástico: ela não consegue utilizar a glicose e ela sofre por isso. Mas ela consegue utilizar os corpos cetônicos.
Isso é o começo do que a gente poderia falar. Mas talvez seja o mais importante.
Autismo: Como A Dieta Pode Influenciar
Roney – Perfeito, Régis. Então até com relação ao Alzheimer estão descobrindo ainda bastante coisas. E é difícil tratar.
Mas é interessante saber que pode ser quem sabe um dia exista um tipo de alimentação ou até medicação como você falou que está sendo estudada e pode melhorar a condição dessas pessoas.
Régis, a gente mencionou sobre o autismo no começo da entrevista, mas não chegamos a abordar com mais profundidade aqui no podcast.
Então a gente queria saber se você poderia aprofundar um pouco sobre essa relação entre alimentação e autismo por favor.
Régis – Claro, vou falar um pouco mais sim.
É interessante que o autismo é um mundo ainda muito misterioso para toda a comunidade científica.
Claro que vamos descobrindo e sabendo cada vez mais sobre autismo, mas ainda existe muita coisa que não se sabe. Isso é uma coisa importante de se dizer de início.
Agora, a gente pode juntar o conhecimento que vem de diferentes áreas sobre o autismo.
Então, sobre a relação entre alimentação e autismo, o que a gente pode dizer?
O que a gente sabe com maior grau de confiabilidade é que existem intervenções alimentares para autismo e que, em alguns casos pode funcionar. É verdade que, em outros casos, não tem benefícios.
Estou falando de uma dieta tradicional para autismo — que é uma dieta com restrição de caseína e de glúten. Isso é uma coisa que não é nova.
A caseína é a proteína do leite e derivados; e o glúten, proteína que está presente no trigo.
Então, essa intervenção de dieta com restrição de caseína que já se tenta há bastante tempo e que tem resultados controversos: às vezes funciona, para alguns casos funciona bem. Enquanto para outros casos não se tem benefícios.
Mas é verdade que não tem prejuízo — e nenhum risco.
Essa é uma abordagem que no mínimo valeria a pena tentar. Mas ela não é uma abordagem cetogênica, ela é simplesmente uma abordagem com restrição de caseína e de glúten.
(Leia em detalhes: como fazer uma dieta saudável sem proteínas do leite.)
Algumas pesquisas com dietas cetogênicas para autismo são promissoras.
Elas são pesquisas pequenas, é verdade, não existem estudos grandes.
Mas existem estudos de intervenção com o uso de cetogênica em autismo. E elas mostram potencial benefício de várias características sintomáticas do autismo comportamentais, como: agitação, agressividade…
Essas são marcas que, quando elas acontecem, são muito dramáticas e complicadas. E de novo: é uma dieta que não tem riscos.
Então eu diria assim: no mínimo, vale a pena sim ser testado.
Se alguém tem um familiar, um filho com autismo, eu diria isso: vale a pena testar.
Existe um potencial benefício — e às vezes é um benefício grande.
Como muitos quadros de autismo (por exemplo um quadro moderado a grave) são quadros dramáticos, qualquer benefício e qualquer grau de melhora costuma ser algo muito significativo.
Então, por exemplo, uma criança que não é verbal — porque é uma das possibilidades do autismo: a criança não ser verbal, não se comunica, não fala… ela não se comunica através da fala, mas pode se comunicar de outras formas.
Bom, se ela faz uma dieta cetogênica e começa a falar algumas palavras, isso para a família e para a criança é algo extraordinário, é uma diferença muito grande.
Existem trabalhos mostrando que é possível.
Existem muitos relatos mostrando que é possível.
Eu sou fascinado por essa área especificamente, porque justamente como estava dizendo antes, é um quadro dramático, e qualquer benefício é bem-vindo. E a dieta cetogênica tem um potencial.
Claro que a gente precisa de estudos maiores. E talvez os estudos maiores venham inclusive ampliar esse benefício: talvez a gente descubra que a dieta cetogênica é mais benéfica do que a gente já pensa que ela é.
Então a gente precisa esperar estudos grandes.
Mas, sendo uma intervenção sem risco, para um quadro que pode ser grave, onde existe muita pouca alternativa — eu não tenho dúvidas que o teste é válido.
Guilherme – Exatamente. Olhando para uma questão de “custo-benefício”, como você falou, não tem realmente uma contraindicação.
Não há um motivo para não experimentar, sendo que tem potencial de melhora.
Acho que com certeza faz muito sentido pensar nesses termos para se avaliar: é uma coisa que não tem risco e podem trazer melhorias.
A Mensagem Final Do Dr. Régis Para Você
Roney — A gente está chegando a parte final do nosso podcast — então, se você achou que ficou faltando alguma coisa, se tem algum complemento sobre os assuntos que a gente tratou até agora, sinta-se à vontade para colocar agora.
Se não, você pode deixar a sua mensagem final aqui para os Tanquinhos e Tanquinhas, e também suas mídias sociais.
Régis – Ah, perfeito. Acho que a gente falou sobre muita coisa, assuntos interessantes e importantes.
O que eu diria talvez para encerrar é algo que diz respeito especificamente a pessoas com algum transtorno psiquiátrico.
Eu e a grande maioria dos meus colegas psiquiatras já vimos inúmeras vezes que as pessoas têm muito receios de se consultar com um psiquiatra.
Claro que o receio é por estigma, e às vezes a gente tem que combater o estigma.
Mas muito do receio é porque a principal abordagem que a psiquiatria em geral oferece são remédios.
A gente vê com muita frequência que o tratamento psiquiátrico é baseado no uso de remédios.
As pessoas se acostumam a pensar com receio em relação a isso.
Por tomar uma quantidade grande de remédios, ou por tomar remédios durante muito tempo, elas se preocupam com todos os efeitos colaterais frequentes nos remédios psiquiátricos.
O que eu diria como recado final é o seguinte.
Remédios não são as únicas alternativas.”
O remédio não é a única alternativa e nem a única ferramenta que a gente tem.
Talvez seja o que a psiquiatria tradicional sempre ofereceu.
Mas, quando a gente começa a trabalhar com intervenções alimentares, isso começa a empolgar — não só os pacientes, mas os profissionais. E isso é é uma revolução na prática clínica.
Inclusive para mim — entre outras coias, isso mudou a maneira como eu me relaciono com a psiquiatria.
Passou a ser muito mais gratificante exercer a psiquiatria com essa ferramenta na mão.
Porque tem muitas pessoas que não querem usar remédio, por exemplo.
Agora elas têm uma alternativa com essa abordagem.
Têm pessoas que querem tentar algo antes do remédio — não são necessariamente contra o remédio, mas querem como primeira opção.
Muita gente tem isso.
Então a gente tem boas possibilidades com abordagem alimentar.
Especialmente pessoas que fazem tratamento psiquiátrico há tempos e não têm melhora significativa.
Isso é uma coisa que a gente vê com frequência.
Quadros crônicos, quadros arrastados. Pessoas que já tomavam dois, três, quatro, cinco tipos de remédios… e não se sentiram bem. Ou tiveram muitos efeitos colaterais. Elas melhoraram, mas às custas de muitos efeitos colaterais.
Ou então, não tiveram essa melhora significativa: melhora um pouco, mas depois piora. Mas não se sentem verdadeiramente bem.
Essas pessoas são quem pode cada vez mais se interessar pela low-carb/cetogênica como alternativa.
E são as pessoas pelas quais eu tenho cada vez mais me interessado.
Então saiba: existem essas alternativas.
E, se alguém que está ouvindo e está nessa situação e/ou conhece alguém nessa situação, saiba que é possível usar outras abordagens, é possível também ter outras ferramentas alimentares que podem ser tão ou mais eficazes que os remédios, sem os efeitos colaterais que os remédios têm.
É claro que não estou dizendo que todo mundo vai melhorar com low-carb/ cetogênica. Não é uma pílula mágica, e a gente sabe que não é. É preciso deixar isso claro.
Mas o recado é: existem alternativas, e elas se mostram cada vez mais eficazes. Eu deixaria essa mensagem.
Pessoas que querem ter algo diferente na psiquiatria: existe essa possibilidade.
Hábitos Saudáveis Para A Boa Saúde Mental
Guilherme – Perfeito, Régis. Faz muito sentido isso. Eu queria saber se tem hábito ou há hábitos que você tem e incentiva as pessoas a ter para cuidar da saúde mental como um todo. Outros hábitos saudáveis, além da alimentação.
Régis – Sem dúvida, vários. Vários hábitos saudáveis que são importantes, e a gente sabe que interferem.
Alguns que são frequentemente negligenciados incluem, por exemplo, o sono.
A qualidade do sono é algo fundamental.
A gente sabe que o sono interfere em vários processos.
Mas um deles que se fala pouco, mas que eu falo muito com os meus pacientes é o que eu chamo de fontes de gratificação.
O que eu quero dizer com isso?
Coisas pequenas, nada muito grandioso, mas corriqueiras que nos deem satisfação, nos dê um estado bem-estar pode ser pequenas coisas.
Mas é muito frequente, e a gente vê isso na nossa vida, porque é quase algo automático: passar os dias trabalhando, cumprindo as obrigações, fazendo as coisas em casa…
E passar vários dias sem ter nada realmente gratificante naquele dia.
Então, colocar pequenas gratificações pulverizadas ao longo do dia a dia é algo para mim é extremamente importante, eficaz, não é tão difícil… e ainda é pouco falado.
Acho que isso é uma coisa fundamental.
Roney – Excelente, Régis. Agora, pode deixar as suas mídias sociais.
Porque tenho certeza que o pessoal que ouviu sua entrevista até aqui gostou muito, e vai querer saber mais sobre você, e vai querer te acompanhar em alguma mídia social que você tiver presente.
Régis – Claro, obrigado.
Eu tenho usado basicamente o Instagram como ferramenta de divulgação de informação e de contato com as pessoas.
Tem o meu Instagram que é o @dr_régis_chachamovich: https://www.instagram.com/dr_Régis_chachamovich/
Ali as pessoas podem seguir.
Eu tento colocar com a maior frequência que eu consigo informações de qualidade.
Então estudos e informações que são úteis para as pessoas em geral: sobre saúde mental, sobre saúde metabólica em geral e outras coisas.
Se as pessoas quiserem entrar em contato por mensagem, por direct, podem ficar à vontade.
Eu gosto de interagir, e gosto de responder as mensagens.
Então essa é a ferramenta que eu uso. E as informações pessoais, informações de contato, estão lá também.
Roney – Excelente. A gente vai deixar todos esses links na transcrição do podcast para quem quiser clicar direto e já ir para o seu Instagram. Tá certo, Régis?
Então muito obrigado por sua participação no podcast. Com certeza foi uma entrevista super rica e super cheia de valor para quem escutar.
Régis – Gente, obrigado pelo convite. Adorei o bate papo, foi ótimo, tomara que as pessoas gostem. Muito obrigado!
Roney — A gente que agradece, e com certeza vão gostar porque ficou uma entrevista incrível! Muito obrigado novamente Régis.
Também quero agradecer a quem acompanhou a gente até aqui: muito obrigado pela sua audiência!
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Tem episódios novos todas às segundas e sextas-feiras.
A gente se fala num próximo episódio. Um forte abraço.
Muito boa essa matéria sobre alimentação e saúde mental. Obrigada por compartilhar , vocês estão de parabéns.
Oi Rosana, boa tarde!
Muito obrigado, ficamos felizes em saber que gostou.
Forte abraço!